Narrativas do cotidiano

segunda-feira, 21 de dezembro de 2009

Oficina de Notícias - Uma prática essencial

Escrever um jornal laboratório não é tarefa fácil. Acordar cedo, estar antenado a tudo que acontece e, principalmente, saber transformar os acontecimentos em notícias relevantes é trabalhoso até mesmo para quem se dedica integralmente a esse trabalho, imagine para estudantes que encaram pela primeira vez o desafio de escrever um jornal de qualidade. Muito acostumados ao método convencional de ensino, a oficina de jornal impresso tem surpreendido positivamente vários alunos do curso de Jornalismo da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia, que vivenciando a experiência de associar teoria à prática pela primeira vez, conhecem de perto as dificuldades e glórias da profissão que escolheram exercer.

Carina Marjorie, estudante do III semestre de comunicação da UESB, acorda cedo todas as vezes que precisa deslocar-se até a faculdade para assistir às aulas práticas. O professor cobra pontualidade dos alunos não apenas por ser rigoroso, mas principalmente por entender que essa experiência é determinante para aqueles que pretendem seguir com o curso. A estudante, natural de ilhéus, esforça-se para chegar no horário e compreende a importância das aulas práticas em seu curso de graduação. Mesmo reconhecendo as dificuldades de se produzir um jornal, que segundo ela envolve uma série de questões tais como: escolha de tema, elaboração de pauta, busca por fontes, dentre outros fatores, a estudante diz que “embora trabalhoso e desgastante, ao final nos traz conhecimentos mil, amadurecimento enquanto pessoas e futuros profissionais”.

A opinião da jovem é semelhante à de outros alunos que levam a sério o Oficina de Notícias, jornal-laboratório da instituição. Quando questionado sobre a relevância da oficina de jornal impresso, Ramon Ferraz, também estudante do III semestre, diz que a experiência é válida, e que mesmo não estando acostumado à pressão e às cobranças de prazos e escrita impecável, compreende que sejam elementos necessários para a sua formação e amadurecimento profissional. Outra estudante do mesmo curso, Raisa Casemiro, afirma que a experiência está sendo importantíssima não só pra ela, mas para quem pretende seguir na profissão. “Esse momento é crucial para quem tinha dúvidas se seguia ou não no curso, pois acredito que seja semelhante ao que vamos encontrar lá fora. Caso alguém não consiga se adaptar agora, vai ser muito difícil ter sucesso no mercado de trabalho.”, afirma a jovem.

O Oficina de Notícias é um jornal feito por estudantes, mas direcionado à toda a comunidade. E engana-se quem pensa que apenas aqueles que vivenciam atualmente a experiência é quem dá valor aos ensinamentos das aulas. Indhira Almeida, jornalista formada há cerca de um ano e já inserida no mercado de trabalho, reconhece que foi a Oficina de Impresso quem mais a preparou para encarar o ‘mundo lá fora’. “Uma Oficina de Impresso é fundamental para um jornalista. Como o próprio nome já diz, é um espaço para a experimentação, onde o aluno pode ousar e criar, saindo dos limites impostos pelas linhas editorais dos jornais de circulação tradicionais.”

Um estudante do III semestre pode afirmar que a produção feita em laboratório é semelhante ao que encontrarão após a faculdade, mas a afirmativa ganha muito mais respaldo quando algum profissional atuante reconhece a importância de tais produções. Indhira, que trabalha na TV Sudoeste, afirma que “ É na Oficina de Impresso que vemos o poder que as palavras possuem, e a atividade jornalística também. É receber um email com uma crítica de um leitor, que não gostou do posicionamento do aluno- jornalista. É tomar chá de cadeira de uma fonte, ou até mesmo levar um bolo. É ir a fundo em um assunto, investigar, insistir, persistir. É guardar o depoimento de uma fonte, para ter a segurança de que ele negará uma afirmação. É nosso primeiro contato com a ética, primeiro compromisso com a veracidade dos fatos, com a idoneidade.”

Para a profissional, a Oficina de Impresso só não chega mais perto da realidade porque alguns não se comprometem, não entregam matérias no tempo estipulado e talvez não compreendam que em um jornal convencional, isso significaria uma demissão. Além da falta de compretimento por parte de alguns, outros problemas, como os vivenciados pela turma do III semestre, podem afetar a produção dos jornais, como, por exemplo, a falta de alguém que saiba diagramar ou tirar fotografias profissionais. O curso não disponibiliza disciplinas que possam capacitar os alunos e todos tem que ficar a mercê de alguns colegas de outros semestres que emprestam seus talentos para que o jornal possa ser produzido.

Porém, com todas as dificuldades possíveis, o Oficina de Notícias consolida-se como uma das experiências mais marcantes para quem finca o pé e decide levar a “profissão repórter” adiante. Perde-se sono, ritmo e até paciência, mas a recompensa vem em dobro quando o jornal chega em suas mãos e você logo fita os olhos naquelas letrinhas minúsculas indicando seu nome, que talvez passem despercebidas a muitos olhos, mas não daqueles que sabem do trabalho que é passar por todos os processos, desde elaboração de pauta até a correção dos erros mais “indectáveis”.

domingo, 4 de outubro de 2009

Era uma manhã de verão como outra qualquer no interior da Bahia, Mário o enigmático poeta conquistense que vivia solitário em seu apartamento no centro da cidade, acordou ao som estridente do despertador que ficava no criado mudo ao lado da cama, programado para alarmar às cinco da manhã. Como sempre, levantou afoito e assustado, deu um salto direto pro banheiro, metodicamente fez a barba, entrou no box, tomou um banho quente mesmo estando lá fora um calor infernal, mas ele sempre se lavava com água quase fervente, e portanto não poderia sair dessa sua rotina.

Voltou ao quarto, dirigiu-se ao guarda-roupa, no qual estavam todas as suas camisas sociais vermelhas, as suas calças jeans azul-claras, suas cuecas sempre brancas e os seus dois mocassis um preto e outro marrom. Passava cerca de cinco minutos escolhendo não se sabe o que, pois todas aquelas roupas eram iguais, era um figurino típico e uniforme daquele homem atordoado, artístico, poético e intensamente triste pela falta de amor, paixão, amizade. Era um coração desfalecido, uma vida onde os moinhos não giravam, era simplesmente um aquilo dentro dos diversos modos de vida existentes.

Mário vivia dos livros de poesia que vendia na praça logo em frente ao seu modesto lar, todos os dias às sete da manhã ele permanecia junto da Loja Fênix, só saia para comer aquela gororoba do restaurante do Seu José, que vendia um PF com refresco de caju por quatro reais e noventa centavos. Sem alternativa, Mário sagradamente se sentava à mesa de boteco forrada com toalha xadrez, comia aquilo e não se importava com a qualidade, sua vida era sim insignificante. Após o pobre almoço, retornava ao seu ponto de venda, onde vendia aqueles livros que nem mesmo ele conseguia ler, eram poesias sem alma, ridículas, daqueles poetas de pouca perspicácia e sem arte, tal fato o revoltava. Ele um grande poeta não tinha se quer a possibilidade de declamar a sua poesia em público, já que era mudo, quanto mais publicar um livro com suas obras esplêndidas e superiores aquelas.

No fim da tarde, passava na padaria do Seu Júlio – comprava cinco pães, um litro de leite, chegada em casa indo para a cozinha coar o café, ferver o leite (que geralmente derramava com freqüência), esquentava o pão com manteiga na panela aquecida pelo fogo do pequeno fogareiro de duas bocas que conservava próximo a pia de lavar pratos. Assim constituía o seu banquete noturno, posteriormente tomava um banho frio na noite gelada da cidade conhecida como a Suíça baiana, mas ele pouco se importava, pois era isso o cotidiano das suas noites tenebrosas e ao mesmo tempo produtivas, visto que era nesses instantes que a inspiração surgia. Após o banho, vestia o pijama vermelho com bolinhas brancas, o único que possuía no seu armário, acomodava- se no velho sofá da sala, assistia um pouco do noticiário televisivo.


Então por volta das 24 horas, sentava na cadeira plástica junto à mesa forrada com uma toalha verde-limão, ali produzia a sua obra poética, que era sim desconhecida, contudo sua vida sem sentido ganhava algum através da sua alma poética e muda, que lhe fazia transcender todas as dores, temores, todo o seu mutismo, apenas aumentando a vontade de declamar o escrevia.

Num certo dia, especificamente em 24 de maio de 2002, Mário fez tudo aquilo que sempre fez, cumpriu todo o esquema infeliz e rotineiro. Porém isso só durou até passar na padaria do Seu Júlio, onde comprava o pão e leite de cada dia, ali ocorreu algo diferente, não era mais o velho Júlio que estava atrás do balcão, mas sim uma linda moça de mais ou menos vinte anos. Tal fato deixou Mário curioso e desconfiado, ele um cara de trinta anos, viu aquela linda garota trabalhando naquela padaria suja e grotesca... Logo se perguntou: “Onde estar o velho Júlio?” e o pior é que não tinha nem como perguntar, ele era mudo. Ficou lá olhando, foi quando alguém que também comprava o pão e o leite de cada dia comentou com outro alguém que o velho Júlio estava doente, por isso que sua neta Ana veio de Planalto para tomar conta dos negócios. Tendo escutado isso... Escutado? Sim escutado, pois Mário era apenas mudo, ele perdeu a voz ainda na infância quando teve um problema nas cordas vocais e teve que praticamente tirá-las. Ele retornou para seu apartamento com a bela imagem de Ana cravada em seus neurônios. Naquela noite não conseguiu se quer dormir, fechava os olhos via Ana, se fosse pensar em algo pensava em como conquistar aquela formosura de menina – A insônia percorria a noite, e seu coração estava realmente apaixonado como nunca esteve, deixou de ser leviano. Suas poesias depressivas, sombrias e tristes, passaram a pulsar de forma diferente, mais apaixonante e apaixonada.

Ana pouco notava aquele pobre poeta mudo, ela nem se quer sabia de quem se tratava, entretanto certo dia Mário se apresentou através de uma linda orquídea com um bilhete perfumado que dizia: “Olá Ana, sei que você não me conhece, nem se quer me nota, porém eu sou aquele que mudamente lhe ama, que passa noites em claro em busca do seu olhar, que observa seu leve caminhar todas as manhãs em frente a Loja Fênix e que humildemente compra a partir de suas lindas mãos pães e leite. Meu nome é Mário e estarei hoje na padaria as 19 horas vestido com uma camisa verde, calça preta e sandália de dedo azul.”

No horário previsto no bilhete, Mário compareceu, enquanto Ana atrás do balcão estava aparentemente tranqüila, mas seu jovem coração estava aflito para saber quem era o autor daquele lindo e enigmático pedaço de papel perfumado. Mário entrou na padaria, e lá estava Ana com os olhos brilhantes olhando fixamente para a maravilhosa orquídea que havia lhe custado alguns dias sem almoço no restaurante do Seu José. Ele se aproximou lentamente, então foi quando Ana reconheceu aquele perfume... Virou-se e deu de cara com um homem trajado como o previsto no bilhete, de um olhar triste e apaixonado, com um leve sorriso no rosto sobre a barba por fazer, logo notou que era o tal do Mário. Ela começou a conversar com ele, mas era obvio que ele nada respondia. Isso deixou Ana irritada, contudo Mário através de gestos explicou que era mudo. A menina achou graça de si mesma, por não ter percebido antes, e logo se desculpou. Pegou papel e caneta entregou a Mário, assim puderam dialogar. Foi uma “conversa” produtiva, engraçada que aquele homem metódico até se esquecer que deveria estar em casa sempre antes das 19 horas. Conversaram bastante e marcaram para sair na noite seguinte.

Ana gostou muito do seu mudinho, como ela mesma dizia para as amigas, já Mário não conseguia disfarçar a sua alegria, agora a sua vida era sim muito para ser insignificante. Eles saíram muitas vezes, começaram a namorar, noivaram e foram morar juntos. Ana passou a declamar as poesias do seu poeta mudo entre seus familiares, amigos e conhecidos, até que certo dia um homem bem trajado ficou sabendo do sucesso de um tal Mário Cajazeiras, e se dirigiu ao centro de Vitória da Conquista para saber quem era aquele homem e sua fiel declamadora conhecida como Ana Elgin. O homem bem trajado era Aluízio Fernandes dono de uma editora paulista que logo se interessou pelas poesias do poeta mudo. Dessa forma Mário e Ana tornaram-se regionalmente conhecidos através daquela arte que por tanto tempo esteve afonia e morta entre as paredes silenciosas do humilde apartamento central e sombrio de um homem que por longos anos foi extremamente triste.

Havia chinelos espalhados por todo o banheiro. A água corria lento sobre a escova já velha, esperando o movimento automático de todas as manhãs. Olhou-se no espelho e incomodou-se com os pelos ralos que surgiam em seu rosto. Queria sempre parecer mais jovem,mesmo que seus olhos cansados demonstrassem o contrário.
O ritual era sempre o mesmo; tomava um banho rápido para despertar e, quando no inverno, mudava a temperatura para não arrepender-se de ter levantado. Vestia-se com as mais belas roupas que seu salário médio podia comprar; aquela nova secretária despertava nele mais que uma admiração promíscua. Se seu semblante não bastasse para conquistá-la, erroneamente acreditava que algumas roupas de marca pudessem chamar sua atenção. Nasceu Francisco, mas incomodado com as lembranças que esse nome trazia, preferia ser chamado de Franco. Fernanda, a nova secretária, não sabia, e sempre o chamava pelo nome completo. Engraçado que isso não o incomodava, não a corrigiu sequer uma vez.
Ela não era como as outras que haviam passado pelo escritório: sabia citar Shakespeare com precisão e seu vocabulário era composto por 4 línguas. Tinha uma beleza escondida atrás daquele coque e daquelas saias de linho, e isso despertava nele uma curiosidade insaciável. A rotina tornou-se um ritual de beleza; pedia dinheiro emprestado para impressioná-la cada vez mais. Mas foi logo quando sua roupa manchou-se de tinta, seus sapatos perderam se na chuva, que ela encontrou nele um refúgio.

Suas lágrimas desciam silenciosamente enquanto esperava o ônibus de volta pra casa. Luiza tinha um segredo, mas sua mente cheia de idéias confusas escondiam-no bem. Suas amigas insistiam que contasse, mas a elas respondia apenas com um silêncio amargo e frustrante; mesmo sabendo que era melhor contar, guardava só para si a angústia da notícia que recebera dias atrás.

O trajeto para casa parecia mais longo que sempre, mesmo sendo a mesma distância; as imagens da janela agora pareciam desenhos borrados sem nenhum significado. Luiza não agüentava mais chorar pelos cantos, inventar desculpas para não se divertir com os amigos e ver o sol da rua só quando precisasse ir à farmácia ou ao supermercado. Por 10 dias não fora à aula, e evitava atender o celular. As poucas vezes que abria uma exceção era para dizer que estava tudo bem, que não precisavam se preocupar mesmo desejando dizer o contrário. Bom, é claro que ninguém acreditava, mas fingiam bem para evitar um desconforto.

Enquanto subia uma rua, o ônibus quebrou e tiveram que trocar. Nesse breve intervalo ela recebeu uma ligação; já estava preparada para desligar, mas resolveu checar o número antes, meio que por acaso. Não acreditou no que ouviu. Todas as lágrimas, a tristeza estampada em suas milhares de expressões tinham sido em vão: não houve seqüestro, nem acidente: tudo não passou de uma brincadeira de mal gosto. Seus pais estavam de volta, seus irmãos estampavam a mesma alegria, mas ela não desejava estar ali. Sua família não era aquela, mesmo que ligados pelo sangue, não acreditava que tinha sofrido tanto tempo por uma “brincadeira de criança”. De repente viu subir aquela rua três seres que estava acostumava a ver todos os dias, com seus defeitos estranhos e qualidades invejáveis; precisava de uma desculpa urgente para explicar sua ausência, mas naquele momento só queria sentir o calor de um abraço. Alguns poderiam não entender a felicidade que sentiu ao dobrar aquela esquina, mas ela sabia, por mais clichê que parecesse, que era àquela família que queria pertencer. Suas amigas podiam ser loucas e até ter todos os defeitos do mundo, mas não precisava provar nada: só um abraço sincero era toda a certeza que precisavam ter.

Ele era um simples garoto de classe média da zona sul carioca, morava no Leblon com sua avó materna, loiro e surfista, assim era Jair. Ao nascer do sol o Atlântico era o seu caminho, a areia escura e quente o chamava como num magnetismo que não tinha fim, o dia morria, a lua onipotente embalava os fins de tarde ventilados e sonoros do violão Di Giorgio que Jair possuía. Juntamente com todos os garotos do Leblon, também loiros e surfistas, ele entoava as mais variadas canções, era um pouco de Jack Johnson com Tim Maia, era um muito dos “Bobs” Dylan ou Marley, e nunca faltava Raul, Cazuza, Titãs e tantos outros nessa salada musical. Chegava à noite, por volta das 19h00min, Jair retornava para a sua casa, um belo e espaçoso apartamento no quarto andar do majestoso Ed. Le Blond, no qual sua avó o esperava com os mais variados quitutes culinários e com sua roupa de ir para a faculdade passada em cima da cama. A aula de Jair começava às 19h30min, logo se vê que ele sempre chegava atrasado ao Curso de Arquitetura da UERJ (Universidade do Estado do Rio de Janeiro), mas mesmo assim sempre chegava lá guiando o seu Ford KA vermelho sangue. Era ele um rapaz de vinte e dois anos, querido e popular entre as meninas dos mais variados cursos da universidade, era adorado pelos colegas de sala pela sua capacidade de proporcionar momentos de alegrias naquele cotidiano universitário. Quanto aos professores, pouco se importavam com aquele surfista musical e engraçado, até porque ele não fazia por merecer, pois Jair era o famoso bagunceiro, era o tipo de cara que não estudava, o seu grande “mérito” era puxar um beck no banheiro masculino. E apesar de não se dedicar aos livros, sempre passava naquelas provas pitorescas que muitos dos nerds perdiam. Jair achava muito graça de disso tudo, o que muitas vezes gerava conflitos com aquele grupinho de meninos feios, com óculos fundo de garrafa que sempre sentavam na primeira fileira. Enquanto ele ficava lá no famoso fundão apenas treinando a sua grande habilidade de desenhar mulheres peladas, carros de corrida, e também de enrolar vários becks por segundo. Jair já estava no terceiro ano do Curso que tinha duração de quatro anos. Ele até suportava a Arquitetura, amava o surf e a música, porém não sabia o que deveria seguir, já que se dizia bom em tudo isso. No ano de 2005, Jair se formou e arrumou um emprego na Construtora Assis de Castro, a qual o seu tio Renato Assis era dono, e como uma forma de ajudar arrumou um emprego para aquele sobrinho que pouco sabia sobre Arquitetura e que passava o dia todo na praia fumando maconha, tocando violão e pegando onda. Enquanto isso os nerds do tempo de faculdade estavam ricos, respeitados, cheio de mulheres, pois como se diz: “os CDF de hoje serão os maiorais de amanhã”. Entretanto Jair pouco se importava, o que ele queria era mesmo sombra e água fresca, praia e sol, mulheres lindas e formosas, violão e becks, festas e carros, queria apenas diversão e um trabalho para pagar os seus gastos cotidianos. Ele achava que o sucesso não estava em ser um rico, empresário, maioral e tudo mais, para Jair o que valia era sentir a vida de forma simples, hippie e filosófica. Sua ideologia era simplesmente não ter ideologia.

sexta-feira, 18 de setembro de 2009

Acordei de um sonho ruim, e incomodei-me com as luzes acesas no corredor paralelo à minha porta. Não costumo me lembrar dos detalhes e tampouco do enredo de meus raros sonhos, mas naquela noite estava tudo muito claro, tão claro como a luz que cegava os meus olhos. Recordei de quando era mais nova e assustava-me
com o barulho do vento na janela e ia correndo pedir socorro à mamãe, logo ali em frente. Não só por orgulho mas também por bom senso, esta opção estava descartada. Teria eu mesma que me consolar e dizer mentalmente que tudo bem, foi apenas um sonho. Difícil mesmo é me convencer disso. Como não é comum, não criei um escudo anti-pesadelos, e voltar a dormir para sentir a mesma sensação causavam em mim uma agonia que não saberia explicar facilmente. Desci na ponta dos pés, ligando todas as luzes para que me dessem alguma proteção. Bebi um copo d'água e subi lentamente. A sala estava a caminho do quarto, resolvi dar uma escapada já que o sono havia se perdido pela casa. Liguei a tv num movimento automático, e por sorte não era nenhum falso programa de apelações religiosas ou promíscuas. Eu já havia assistido aquele filme, mas não me lembrava de todas as cenas, então resolvi assistir para recordá-las. Deitei no desconforto do sofá mas não acompanhei o restante das cenas. Dormi, sem mais trabalho. Acordei na manhã seguinte com dores nas costas, mas sem nenhuma lembrança do sonho assustador.

terça-feira, 1 de setembro de 2009

Sinto um vazio profundo, busco a alegria escondida em algum lugar. Hoje li Fernando Pessoa, pensei em escutar Legião, mas desistir é profundo demais. O Pessoa é genial, pessoal e anormal, é toda a profundidade do mundo... e eu ainda me sinto no fundo. Sinto um vazio inexplorável, numa busca inconstante por algo ao menos inocente. Hoje sou um número na carteira, amanhã talvez possa ser a carteira com um número. Vejo o mundo apoteótico, a vida é sua Odisséia - Talvez eu seja uma Helena de Tróia, e nada mais. Sinto o que não quero e quero o que não sinto. O latido do cachorro ecoa sobre a noite fria, os carros passam ferozmente sobre o asfalto que ora foi quente, a noite urge o silêncio e as luzes amareladas entoam uma mudez. A varanda companheira de tantas horas permanece ao som de seis cordas... em meio ao silêncio ecoa uma voz solitária e ao mesmo tempo forte. A madrugada chega, o cachorro não late mais, os carros adormecem, as luzes se apagam e o silêncio é aquele que permanece.